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SAIA  
A segunda pele no cinema e nas ruas.

POR VICTOR PEREIRA
 
     
 
 
Saia: roupa para a parte inferior do corpo, de aparência tubular ou cônica, que se usa presa na cintura. Em geral é utilizada por mulheres e garotas (...). De acordo com o Dicionário Ilustrado Moda de A a Z, de Alex Newman e Zakee Shariff, esta é a definição da peça de roupa saia. Vale ressaltar que os autores fazem uso do termo ‘em geral’ para se referir ao público alvo, as mulheres. E por quê, nós homens, não podemos usar saias? Na verdade eu acredito que a pergunta correta a nos fazer é: por que nós homens não usamos saias? Desde o surgimento da distinção de gênero para a roupa, por volta do século XIII, homens e mulheres não podiam usar outrem que lhes foram estabelecidos, na verdade até poderiam, mas isso poderia implicar dentre as consequências até a morte. Hoje nós somos o contemporâneo, estamos à frente, somos o futuro. O desenvolvimento trouxe muitos artifícios que facilitam nosso cotidiano em diversos setores da vida. Infelizmente o que se pode perceber é um velho hábito que acompanha o homem desde sua existência: o preconceito.

Em pleno século XXI um homem estar usando saia pelas ruas causa tanto estranhamento e pavor quanto uma mulher de terno. Durante anos as mulheres lutaram para poder ter o direito de usar calças, e por que agora os homens não podem usar uma peça típica do guarda-roupa feminino com liberdade e segurança sem ter sua masculinidade questionada ou sua figura ridicularizada? Primeiro vamos esclarecer um ponto importante: orientação sexual e identidade de gênero. O primeiro refere-se ao que o individuo sente atração física, sexual e afetiva. O segundo é como o individuo se afirma como pessoa à maneira que isso satisfizer seu psicológico para afirmar-se na sociedade. Retomando o comportamento da mulher ante o guarda-roupa masculino, podemos ver em qualquer loja de departamento (fast fashion), a vasta quantidade de peças típicas do homem remodeladas aos padrões femininos.


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Além da variedade de itens que a mulher tem a seu favor, ela apropria-se de blazers e calças (boyfriend), sapatos (Oxford), camisas e camisetões, enfim uma infinidade de opções, enquanto ao homem só restam camisas, camisetas, calças e blusas. Ressalvo que a grande maioria dos homens não faz muita questão de se presentear com peças novas ou atuais.

Vivemos de paradigmas, modelos existenciais que orientam nossas escolhas. Os modelos existem para facilitar nossas vidas. As convenções existem, afinal, para garantir um certo entrosamento, um consenso e por conseguinte uma comunicação entre nós. Acontece que é aí que mora o perigo. O excesso de padronização, que deixamos que se instale em nossas vidas, ameaça estagná-la. Mal nascemos (...) e já nos espiam procurado uma semelhança com alguém: é a cara do pai, da mãe, do vovô, da titia. Mais um pouquinho e todos começam a entoar ao nosso redor em uníssono o “aposto que vai ser...quando crescer”. Vemo-nos repetindo um modelo de existência para o qual fomos progressivamente programados. Você deixou de se referir a você mesmo pelo seu nome desde que era pequeno fazendo uso de um pronome comum a todos para nos designar com unicidade, nada menos pessoal do que esse pronome ‘pessoal’”. (PRECIOSA, 2005, p. 30-32).

Vale lembrar, porém, que a saia masculina é convencional entre os escoceses, e já foi usada antes em nosso país, na década de 50 e com absoluto pioneirismo pelo arquiteto Flávio de Carvalho, nos conta Deise Sabbag em seu livro A Moda dos anos 80. Sem dúvidas que Carvalho quase foi linchado ao transitar pelo centro de São Paulo trajado vestido em saia...




Nos anos 60, o astro Andrius também revolucionou, só que em minissaias como vemos no livro de Maria Claudia Bonadio e Maria de Fátima de Mattos: “Ele é um homem alto, elegante, e seu nome é masculino como nenhum outro: Andrius, que quer dizer homem mesmo [...]”. Um homem usar a minissaia no dia-a-dia causaria muito estranhamento social. “Para o cantor é preciso ter muita cara de pau para usar uma destas” (INTERVALO, 07/01/68, p.23).

O fato que me tornou conhecido através dos meios de mídia, me pareceu de inicio um tanto quanto efêmero, mas só depois de um tempo que ‘a ficha caiu’, pude perceber a gravidade da falha que nossa sociedade possui, onde alguém pára pra criticar a roupa alheia e não vai fazer outra coisa como ler um livro, por exemplo. As reações das pessoas ao me ver de saia durante o trajeto para o campus da faculdade não deveria ser algo de se esperar, nem deveriam acontecer os olhares e as risadas debochadas. Essa mania de ‘costume’ ou de ‘tolerância’ é errônea. A educação e o respeito são equivalentes à altura para substituir esses argumentos fracos e impensados de uma cultura que absorve aquilo que está nas prateleiras sem antes refletir as implicações posteriores em sua afirmação como indivíduo inserido num coletivo, enquadrando-se numa massa onde se é apenas mais um.

A vestimenta, assim como o carro para muitos homens e o salto para muitas mulheres, é uma extensão do corpo que reflete nosso estado de espírito e que vai além de simplesmente nos envolver, a roupa cobre a nudez, protege contra a vergonha e causa no corpo uma “segunda pele”.
Devemos usar aquilo que nos faz sentir bem e totalmente assegurados pelos dispositivos jurídicos que nos garantem esse direito. Não devemos nos questionar muito sobre o que pensarão aqueles que se aprisionam em si,  não experimentando o inusitado, e por conta disso jamais descobrirão o novo. É hora de parar de imaginar e viver na pele, na segunda pele, que é a roupa. E colocar nesta segunda pele a essência de quem veste, seja nas blusas, calças ou saias; para homens ou mulheres. Saia de saia!
 
   
         
  VITOR PEREIRA é calouro no curso de Têxtil e Moda pela Universidade de São Paulo e um exímio louco desconexo que faz tudo o que lhe vem à mente, respeitando o limite do próximo. Conhecido por sua espontaneidade que chega a ser excêntrica para muitos, ficou nacionalmente conhecido por usar saias após o episódio infeliz de um comentário anônimo na internet. Não mudou seu hábito de experimentar tudo o que pode parecer incomum, mas sim sua visão para cada detalhe que a vida proporciona e quase sempre passa despercebida!
 
     
 
   
   
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